ARTIGO – As estatais e os supersalários

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves

“A diferença entre a empresa privada e a empresa pública é que aquela é controlada pelo governo, e esta (a estatal) por ninguém“. A frase de Roberto Campos, uma das mais lúcidas cabeças do Brasil do último século – presente como diplomata observador brasileiro à fundação da ONU, iniciador do BNDES, ministro do Planejamento, senador e deputado liberal – escancara a situação das estatais brasileiras. União, estados e municípios possuem, juntos, mais de 400 empresas públicas ou de economia mista, grande parte delas aparelhadas politicamente e geradoras de déficit que consome o dinheiro público. Em vez de retornar ao cidadão em forma de serviços, os impostos recolhidos custeiam o clientelismo político, a incompetência e até a corrupção. Estima-se que os casos de esbulho ao cofre público em apuração pela Lava Jato e suas similares sejam apenas uma pequena parcela dos realmente existentes. É preciso aprofundar e ampliar as investigações, indo até o nível municipal.

A mudança da política clientelista praticada pelos governos de esquerda (ou social-democratas, como insistem alguns) para o liberalismo pregado pela atual equipe requer solução para o imenso fosso indutor do déficit público. Bolsonaro, Paulo Guedes, Sergio Moro e todo o governo precisam tomar providências – cada um na sua área de atribuição – para dar finalidade a esse monte de estatais. Só manter as que realmente sejam estratégicas ou prestem um serviço que o particular não tem condições de executar. Além de vender ou fechar as suas 170 empresas, o governo federal deve criar parâmetros para o funcionamento das controladas por estados e municípios. A sangria tem de ser estancada ou, então, o país continuará doente.

Quanto às que permanecerem estatais, por sua razão estratégica ou econômica, é necessário acabar com os escandalosos privilégios de salários milionários e vantagens que chegam a proporcionar o recebimento de 16 ou 17 salários por ano. Essas organizações foram criadas com capital público e, se apresentam superávit operacional, este não deve ser distribuído aos seus já bem pagos servidores, mas repassados ao erário em benefício do povo, seu verdadeiro dono. Acabar com as ilhas da fantasia sustentadas pelo cofre público. Servidor que se entender credor de salário astronômico, deve buscá-lo na iniciativa privada onde quem ganha inquestionavelmente vale, pois é permanentemente avaliado.

Supersalários somados à estabilidade funcional estatal é uma das chagas que desfiguram a economia brasileira e até hoje ninguém teve interesse ou coragem de combater. Muitos dos que vão a esses cargos e recebem alta remuneração ali estão com a nefasta finalidade de criar facilidades aos ditos “amigos do rei” ou, ainda, pilotar esquemas de propina e corrupção como os que chegaram ao conhecimento publico nos últimos anos. O teto salarial não deveria ser superior ao que recebem o presidente da República, o governador ou o prefeito, dependendo a que esfera pertencer a empresa. Mas uma série de interpretações e emendas ardilosamente preparadas à legislação levaram ao jeitinho brasileiro. Essa é uma grave questão que o novo governo – se realmente veio para mudar – tem de estudar, identificar e resolver.

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)

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