Ex-deputado confessou que atuou ativamente para a compra de cadeira para o deputado Sergio Ricardo, em 2009
CÍNTIA BORGES / DA REDAÇÃO / MídiaNews
O ex-presidente da Assembleia Legislativa, José Riva, afirmou em depoimento à Justiça Federal que as indicações à vaga no Tribunal de Contas do Estado (TCE) eram acordadas e destinadas a parlamentares que poderiam “pagar mais”.
A informação consta no reinterrogatório de Riva na 5ª Vara Federal de Cuiabá, realizada em março deste ano. O caso é investigado no âmbito da Operação Ararath, conduzido pelo Ministério Público Federal (MPF).
Na ação penal, é apurada a compra da vaga do conselheiro Alencar Soares Filho, em 2009. De acordo com o Riva, a vaga foi comprada pelo então deputado Sérgio Ricardo pelo montante de R$ 15 milhões.
Isso era muito claro no colegiado que falava assim: ‘Você tem dinheiro? Não’. ‘É por que lá vai precisar de tanto’. ‘Então vou providenciar’. Quem negociava a vaga, ia. Isso não foi só com o Sérgio, em outros momentos eu creio que funcionou assim. Mas especialmente nessa do Sérgio foi assim: quem teve dinheiro para bancar […] acertava a vaga e ia
Em áudio gravado durante a audiência, Riva explica à procuradora de Justiça Vanessa Cristhina Marconi Zago que o nome escolhido pela Assembleia para ocupar uma cadeira na Corte de Contas era feita por quem negociava o maior montante (ouça o áudio abaixo).
“Isso era muito claro no colegiado, que falava assim: ‘Você tem dinheiro? Não’. ‘É, por que lá vai precisar de tanto’. ‘Então vou providenciar’. Quem negociava a vaga, ia. Isso não foi só com o Sérgio. Em outros momentos, eu creio que funcionou assim. Mas especialmente nessa do Sérgio foi assim: quem teve dinheiro para bancar […] acertava a vaga e ia”, disse o ex-deputado.
De acordo com Riva, desde que Sérgio Ricardo assumiu o cargo de deputado, ele manifestou interesse em ocupar a vaga como conselheiro do TCE. Em 2009, à época da eleição da Mesa Diretora, Sérgio Ricardo atuava como 1º secretário e as negociações já haviam começado.
“Até na Mesa Diretora foi definido o suplente do Sérgio na Mesa exatamente com essa proposta: ‘olha, eu vou sair, vou para o Tribunal de Contas, quero o compromisso de vocês’. E inclusive foi indicado quem seria o seu vice. Isso foi em 2009. Na primeira eleição dele lá, ele já fala que quer ir pro Tribunal de Contas e o vice dele já é escolhido com essa proposta”, revelou Riva.
Ouça o áudio abaixo:
Vaga por R$ 15 milhões
Conforme Riva, as negociações para a vaga de conselheiro começaram em 2009. Naquele ano, Sérgio Ricardo teria procurado o então conselheiro Alencar Soares Filho, que teria manifestado o interesse em se aposentar e ceder a cadeira ao Legislativo, desde que fosse pago um valor.
Após a conversa, teria sido acordado que Sérgio Ricardo repassaria R$ 4 milhões em montantes diferentes. Pelo acordo, o postulante à cadeira teria pago o montante de R$ 2,5 milhões.
Conforme Riva, antes de Sérgio Ricardo pagar o restante do valor (R$ 1,5 milhões), o então governador Blairo Maggi interferiu na negociata para que, ao invés de Alencar vender a cadeira para o deputado, a vaga fosse ocupada pelo seu secretário à época, Eder Moraes.
Alecar inicialmente aceitou, mas afirmou que já havia recebido R$ 2,5 milhões de Sérgio Ricardo e precisava do outro montante de R$ 1,5 milhão prometido. Blairo chegou a pagar R$ 2,5 milhões a Alencar para que ele entregasse à Sérgio Ricardo a título de restituição, e os outros R$ 1,5 milhão como acordado.
Blairo, no entanto, teria desistido da compra de vaga após uma conversa com Riva. De acordo com o ex-presidente do Legislativo, à época não seria possível abrir mão da indicação de uma parlamentar para indicar Eder Moraes.
Essa foi uma negociação que demorou algum tempo. Quando ela aconteceu efetivamente, já estávamos em outro mandato, e aí a negociação foi por R$ 11 milhões. […] Por isso que eu falo que essa vaga custou R$ 15 milhões: pelos R$ 4 milhões, mais os R$ 11 milhões
Com a vaga de volta a Sérgio Ricardo, uma outra negociação foi feita, e Alencar exigiu o montante de R$ 11 milhões – pagos em R$ 5 milhões pelo Legislativo e R$ 6 milhões pelo próprio Sérgio Ricardo.
“Nós estávamos em 2010, estava acertado que o Sérgio iria participar da eleição e sair depois. Essa foi uma negociação que demorou algum tempo. Quando ela aconteceu efetivamente, já estávamos em outro mandato, e aí a negociação foi por R$ 11 milhões. […] Por isso que eu falo que essa vaga custou R$ 15 milhões: pelos R$ 4 milhões, mais os R$ 11 milhões”, disse Riva.
Denúncia do MPF
Segundo a Procuradoria-Geral da República, foram reunidas provas de que o grupo fez – em dois momentos – pagamentos ao então conselheiro Alencar Soares Filho para que ele se aposentasse.
A medida – iniciada em 2009 – teria sido efetivada em 2012 e permitido a indicação do ex-deputado estadual Sérgio Ricardo para a Corte de Contas. Em troca da aposentadoria (ato de ofício), Alencar Soares teria aceitado propina em valores que podem chegar a R$ 12 milhões, segundo o MPF.
A PGR mencionou detalhes do acordo que envolveu mudança de planos na cúpula da organização e até a devolução de parte da propina pelo então conselheiro – conforme relatado por Riva. De acordo com provas que acompanham a denúncia, os trâmites foram resolvidos em uma reunião realizada no início de 2010.
Na época, Silval Barbosa teria assumido o compromisso de garantir a nomeação de Éder Moraes, o que acabou não ocorrendo.
Ao Ministério Público Federal (MPF), Éder Moraes disse que “algum tempo depois, tomou conhecimento de que Sérgio Ricardo e Alencar Soares teriam voltado a negociar a vaga no Tribunal de Contas”. Disse também que não se opôs à medida porque a vaga era da Assembleia Legislativa. Sérgio Ricardo foi indicado em maio de 2012 por Silval Barbosa.
Para viabilizar os repasses, conforme a denúncia, o grupo contou com a atuação de Júnior Mendonça e de Sílvio César Correia Araújo, então chefe de gabinete de Silval Barbosa (ambos são delatores do esquema). Na denúncia, a PGR apresenta inclusive os comprovantes de depósitos, nota promissórias e anotações apreendidas nas várias fases da Operação Ararath.
Para a procuradora-geral da República, Blairo Maggi praticou por duas vezes o crime de corrupção ativa. Primeiramente na compra da vaga de Alencar Soares. E, depois, em negociação parecida, mas com a intenção de fazer com que o conselheiro permanecesse no cargo.
Já no caso de Sérgio Ricardo, a denúncia implica mais um crime de corrupção ativa que ocorreu após o fim do mandato de Blairo Maggi (quando efetivamente ocorreu a indicação para o cargo) e também a ocultação de vantagem ilícita.
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