Para especialistas, quebra da cadeia de transmissão da hanseníase ainda é desafio

Profissionais da saúde participam de roda de conversa com especialistas em hanseníase - Foto por: Mayke Toscano/Secom-MT

Roda de conversa marcou o retorno das capacitações da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MT), que iniciou em 2019

Fernanda Nazário | SES-MT

Durante roda de conversa com os profissionais da saúde de 11 municípios da baixada cuiabana, especialistas em hanseníase falaram sobre os desafios para o enfretamento da doença. A atividade foi realizada nesta segunda-feira (10.02), na Assembleia Legislativa de Mato Grosso, e organizada pela Secretaria de Estado de Saúde (SES-MT).

Entre as dificuldades elencadas, está a quebra da cadeia de transmissão da enfermidade, que só é alcançada por meio da avaliação dos contatos ligados aos pacientes diagnosticados.

O médico do Instituto Lauro de Souza Lima, Jaison Barreto, explicou aos profissionais que é imprescindível o diagnóstico precoce da hanseníase e o tratamento adequado para o alcance da cura. No entanto, ele pontuou que é necessário também eliminar a probabilidade da transmissão do bacilo da doença.

“Tem que fazer o tratamento e examinar os familiares, já que em 80% das vezes [a hanseníase] é transmitida pelo pai, avô, avó. Então, tem que ir atrás do familiar. Não adianta tratar do paciente com quadro de saúde avançado e não ir atrás da família, porque, dessa forma, não se quebra a cadeia da transmissão e esse é o grande problema. Todo familiar de pessoas com hanseníase precisa ser examinado para que a gente não tenha reinfecção e até resistência medicamentosa”, pontua.

Ele conta ainda que a transmissão da enfermidade só ocorre quando o doente não faz o tratamento adequado e tem um convívio intradomiciliar (mora ou convive na mesma casa) com uma pessoa saudável por um tempo superior a dois anos. Por isso, o médico persiste na necessidade de o profissional de saúde realizar a busca ativa e a avaliação de contato, além de enfrentar o preconceito ao atender um paciente.

“A doença é diagnosticável e tratável em uma Unidade Básica de Saúde. Então, não tem que ter preconceito, pois ela não pega por meio do contato, aperto de mão ou beijo. Para ser acometido pela hanseníase, é necessário conviver debaixo do mesmo teto por muitos anos com uma pessoa já doente. Por isso, não tem porque isolar o paciente ou ter medo da doença, é só ir no posto de saúde”.

Quem sofreu na pele o preconceito foi a aposentada Alzira dos Santos Rodrigues, de 55 anos. Ela recebeu o diagnóstico de hanseníase quando tinha 14 anos, quando passou a ser excluída do convívio familiar e até teve os seus pertences separados dos irmãos. “Tive a colher, prato, copo, tudo separado. Hoje tenho seis filhos e três deles eu proibi de falar o que a mãe tinha, mas fui buscando conhecimento e agora estou curada, no entanto, ficaram as sequelas”, lamenta Alzira que, devido à falta de tratamento adequado, teve os nervos das mãos e pés comprometidos.

“Não quero que as pessoas fiquem como eu fiquei, mas não é só detectar e deixar, porque curar o bacilo é uma coisa. Preciso que [o profissional da saúde] dê continuidade [na busca ativa] na família, pois uma família deveria ser assistida até cinco anos quando encontra uma pessoa com hanseníase”, diz Alzira, que integra a Pastoral da Saúde de Várzea Grande e, juntamente com outras 37 pessoas, ministra palestras e dá orientações sobre hanseníase aos pacientes.

A presidente do Alliance Against Leprosy, Laila de Laguiche, aproveitou a roda de conversa para falar com os profissionais sobre a estratégia global da hanseníase e as ações que Mato Grosso tem desenvolvido para auxiliar o Brasil a atingir as metas estabelecidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

“Nossa ONG age nos estados hiperdinâmicos, preferencialmente. Nós oferecemos capacitação, temos também uma vertente científica e estamos iniciando um grupo de autocuidado”, informa Laila, que é apoiadora das capacitações em hanseníase realizadas pela SES.

Retorno das capacitações

A roda de conversa marcou o retorno das capacitações da SES, que começou em 2019. O secretário Adjunto de Atenção e Vigilância em Saúde do Estado, Juliano Melo, compôs o dispositivo e fez um balanço positivo das atividades, previstas no Plano Estadual Estratégico de Enfrentamento da Hanseníase. “Tivemos uma ampla participação no ano passado, envolvendo diversas áreas da SES com apoio de instituições parceiras. Esse ano temos programado pelo menos nove capacitações no estado”.

Conforme a coordenadora de Atenção às Doenças Crônicas da SES, Ana Carolina Landgraf, Mato Grosso lidera o ranking em número de novos casos de hanseníase no Brasil. Em 2018, foram registrados 4.713 casos, o que corresponde a uma taxa de detecção de 134,1/100.000 habitantes e, por esse motivo, é reconhecido como hiperendêmico.

“Isso mostra o trabalho exaustivo feito pelo Governo do Estado, porque reconhece a necessidade e assume o compromisso de fazer o diagnóstico de todas as pessoas com hanseníase, o que estamos fazendo com muita competência. Prova disso é sermos o maior número de novos casos e um dos menores números de incapacidades físicas. Isso demonstra que estamos conseguindo trabalhar com o diagnóstico precoce evitando sequelas, melhorando a adesão ao tratamento por meio da qualificação do profissional”, avaliou.

Serviço

De terça a sexta-feira (11 e14.02), os alunos da capacitação em hanseníase terão aulas teóricas no Centro Estadual de Referência em Média e Alta Complexidade (Cermac) – localizado na Rua Tenente Thogo da Silva Pereira, n° 63, Centro Sul, em Cuiabá.

Os cursos ocorrerão até novembro e devem qualificar profissionais das 16 regiões de saúde do estado. A atividade é custeada pela Secretaria de Estado de Saúde (SES-MT), em parceria com o Instituto Alliance Against Leprosy, o Instituto Lauro de Souza Lima e as Secretarias Municipais de Saúde.

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