Crônica: Pindaíba

Rodrigo Alves de Carvalho

Zequinha Pindaíba fazia bicos na cidade para sobreviver. Vivia na pindaíba, morava num barraquinho de dois cômodos com uma fossa ao lado. Sempre era ajudado pelos vizinhos e amigos nos mantimentos e roupas, contudo, Zequinha Pindaíba era extremamente alegre, brincalhão e todos gostavam dele.

Quando o circo chegava na cidade, os amigos faziam uma vaquinha para um ingresso e convidavam Zequinha para assistir com eles na arquibancada. Zequinha era mais engraçado que os palhaços do circo.

E assim era a vida do duro, mas feliz Zequinha até que um dia ele arriscou comprar um bilhete de loteria com o dinheirinho que conseguiu limpando vidraças e não é que o sortudo ganhou uma bolada!

Na mesma hora não era mais chamado de Zequinha Pindaíba e sim Zeca da Loteria, o mais novo ricaço da cidade.

Comprou uma bonita casa, roupas, sapatos, eletrodomésticos e até contratou uma doméstica. Agora quando ia ao circo sentava-se nas cadeiras bem em frente ao picadeiro.

Não demorou muito para as solteironas da cidade arregalarem os olhos para cima dele, mesmo que no passado sentissem até asco do mesmo homem.

Mas foi uma baiana de quase quarenta anos que arrebatou o coração de Zeca, chamava-se Jurema Brandão, e mesmo com o passado um tanto obscuro em sua terra natal (diziam que trabalhou numa casa de prazeres masculino) Zeca decidiu casar-se com a conterrânea de Gilberto Gil.

Foi então que a vida de Zeca virou um inferno.

Jurema se transformou da brandura de uma mulher carinhosa para a tirania de uma controladora e aproveitadora do bom coração do marido.

Gastava rios de dinheiro com roupas de grife, tratamentos de beleza e joias.

Contudo, pior que ver seu dinheiro gasto com coisas supérfluas pela esposa era os limites que ela colocava em sua vida. Zeca não mantinha contato com os amigos, não saia de casa e vivia discutindo aos berros de Jurema.

Zeca entrou em depressão, tornou-se um ser sem alegria e só a tristeza era o que conseguia sentir naquela casa com aquela mulher.

Até que não aguentou mais, reuniu forças e expulsou Jurema de casa.

Entregou tudo o que tinha para a mulher, casa, dinheiro e bens materiais. Zeca da Loteria voltou a ser Zequinha Pindaíba e mesmo sem dinheiro, seu sorriso voltara, sua alegria e seus amigos.

Passou a fazer bicos novamente, mudou-se para o barraquinho que tanto adorava. Dizem, não sei se é verdade, que esses dias atrás Zequinha achou um bilhete de loteria na rua e quando conferiu estava premiado, mas na mesma hora rasgou o bilhete em pedacinhos dizendo que nunca mais queria outra vida que não viver na pindaíba.

 Rodrigo Alves de Carvalho nasceu em Jacutinga (MG). Jornalista, escritor e poeta possui diversos prêmios literários em vários estados e participação em importantes coletâneas de poesia, contos e crônicas. Em 2018 lançou seu primeiro livro individual intitulado “Contos Colhidos” pela editora Clube de Autores.

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