A grande discussão nacional desse momento é a imunidade parlamentar. A Câmara dos Deputados, deu um tiro no pé mantendo a prisão do deputado Daniel Silveira e hoje corre do prejuízo pois, ao ceder sua soberania ao Supremo Tribunal Federal, talvez pelo temor de parlamentares lá investigados, acabou por fragilizar todos os seus 513 integrantes. Agora, tramita em urgência a PEC que busca um pouco de proteção mas, como reflexo da vida errante de tantos congressistas, tem a antipatia popular, que a interpreta como tentativa de manter a impunidade.
Silveira não deveria ter postado as ofensas ao STF nas redes sociais. Mas isso não deveria ter sido motivo para sua prisão, cheia de óbices técnico-jurídicos. A Câmara, no entanto, jamais deveria tê-lo mantido encarcerado. O caminho seria libertá-lo e acionar os próprios mecanismos que podem levar até à cassação do mandato por falta de decoro, medida que hoje está propostas mesmo mantida a prisão. Tradicionalmente o parlamento protege seus membros, até como espírito de corpo. Durante décadas, quem pretendesse processar um parlamentar precisava pedir autorização à sua casa legislativa e esta, usualmente, não permitia. Assim foi, por exemplo, no famoso discurso do falecido deputado Márcio Moreira Alves, que confrontou as Forças Armadas – durante o regime militar – e a Câmara negou a abertura de processo, provocando a instabilidade que levou ao fechamento do Congresso e edição do AI-5.
O que desmoralizou a imunidade parlamentar foi o seu emprego exagerado e indevido. Ela deveria ser aplicada apenas para questões ligadas ao mandato, mas durante muitos anos serviu para acobertar crimes comuns e contravenções praticadas por eleitos dos diferentes níveis. Na avassaladora onda de “democracia” pós ciclo militar, parlamentares que buscavam notoriedade demagogicamente por serem ou parecerem “democratas”, cuidaram de relativizar as imunidades e receberam as palmas da claque popular preparada para a medida. Com o tempo, a polícia passou a fazer buscas na sede do parlamento e nas moradias dos parlamentares e eles já não puderam fazer nada. Chegou agora a hora de prender um deles sem qualquer processo ou condenação. E sua casa legislativa, ainda, cedeu…
É preciso corrigir uma série de maus hábitos que enfraquecem o Legislativo brasileiro. Os presidentes – da Câmara, Senado, Assembléias Legislativa ou até das Câmaras Municipais – não podem enfeixar o direito de pautar ou engavetar projetos ou denúncias. Isso tem apequenado a importância da atividade legislativa e criado bolsões de negociação e, possivelmente, até de corrupção. Os comandantes da Câmara e do Senado, pelo menos moralmente, não têm o direito de engavetar os pedidos de impeachment protocolados contra o presidente da República, os ministros do STF ou outros figurões da República. Como administradores da pauta, eles devem apenas decidir a data de discussão e votação, cabendo à totalidade dos deputados e senadores d ecidir se aprovam ou rejeitam.
O presidente Bolsonaro já sofreu 70 pedidos de impeachment. Michel Temer teve 31, Dilma Russeff 68 (um deles a afastou), Lula 37 e Fernando Henrique Cardoso 24. Tais petições deveriam ter sido decididas de imediato pelo plenário e, para evitar que se tornassem meros instrumentos de ativismo político, acarretar a quem denunciou sem ter como provar as irregularidades invocadas, o processo por denunciação caluniosa, que é crime, podendo ser esse procedimento requisitado pelo ofendido ou mesmo pela casa legislativo, através da remessa dos autos ao Ministério Público. Da forma que ocorreu durante todos esses anos, sugere-se uma suposta ascendência do presidente engavetador da Câmara sobre o presidente da Republica, pelo favor de não ter permitido a tramitação das denúncias.
Lucra apenas um homem e perdem o legislativo, o governo e toda a sociedade, que ficam à mercê das pendências. O mesmo se dá no Senado, onde o ex-presidente Davi Alcolumbre, antes de transmitir o posto a Rodrigo Pacheco, mandou arquivar 35 pedidos de afastamento de ministros do STF e três contra procuradores-gerais da República, inclusive o atual, Augusto Aras.
Detalhe: o fenômeno do engavetamento se dá também em níveis estadual e municipal. Também precisa ser resolvido…
Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo) aspomilpm@terra.com.br
Seja o primeiro a comentar sobre "Abaixo as gavetas grandes do Congresso"