Depois de toda a polêmica, que nos levou à sensação de crise institucional cujas consequências ainda não é possível quantificar, a Câmara dos Deputados rejeitou nesta terça-feira, a PEC 135/2019, que determina a impressão dos votos nas urnas eletrônicas como forma de auditoria e eliminação de dúvidas. Mas o assunto não está liquidado. Há no Senado a PEC 182/2007, já aprovada pela Câmara em 2015, que também cria a obrigatoriedade de impressão do voto. Desse projeto, apenas a criação da janela para a mudança de partido sem a perda de mandato foi aproveitada pelos senadores e o restante ficou engavetado. A ideia é desmembrar a questão do voto impresso e tramitá-la no Senado, sem a necessidade de volta à Câmara, pois os deputados já a aprovaram.
O ocorrido com a PEC 135 tem mais relação com o momento insólito vigente na política nacional do que com as medidas nela contidas. A impressão dos votos em nada prejudicaria o atual processo eleitoral (e até lhe conferiria mais segurança) e a não impressão não constitui indicativo de que haveria fraude deliberada. Portanto, não é crível o que afirmam o ministro Luiz Roberto Barroso, presidente do TSE, que garante a inviolabilidade e segurança das urnas eletrônicas, nem o que diz o presidente Jair Bolsonaro, que sem voto impresso s eleições poderão ser fraudadas. São meras suposições que apenas inflaram a discussão, mas não trazem solidez às afirmativas e, positivamente, não devem ter sido a razão da decisão de voto dos deputados, tanto 229 os que votaram a favor quanto os 218 contrários ao projeto que, para ser aprovado, precisava de 308 votos. Foi apenas mais uma queda de braços com componentes surreais e milhares de eventos paralelos tumultuadores. Mas nesse momento, a Câmara dos Deputados resta com a obrigação de dizer à Nação a razão da decisão de seus membros e, inclusive, pelo que decidiram, garantir de que não há o risco de fraude.
Afora o conflito estabelecido, há que se considerar outras propostas que atenderiam os objetivos constantes tanto na PEC 135 quando na 182. É interessante a proposta do engenheiro Carlos Rocha, que participou do processo de desenvolvimento das urnas, nos anos 90, de em vez de se imprimir os votos, criar-se a certificação digital que coloque voto-a-voto em condições de ser apurados, reapurados e auditados. Isso – lembra o técnico – já é possível com a tecnologia e a legislação hoje disponíveis em nosso país.
Outro ponto defendido por Rocha é a descentralização do processo de apuração, hoje restrito ao TSE e mantido como propriedade de seus técnicos. A proposta é que, além de certificados, os votos sejam disponíveis para passar pela fiscalização dos partidos e por auditorias independentes, sempre com caráter técnico e jamais político-partidário. Isso afastaria todas as dúvidas hoje pendentes como a de invasão do sistema por hackers conforme o ocorrido em 2018 e apurado em inquérito da Polícia Federal.
A confiabilidade do processo eleitoral é fundamental à sociedade. Ela dará ao eleitor a certeza de que o seu voto foi contabilizado para o candidato de sua preferência, tenha ele sido ou não eleito. Os deputados que votaram a PEC 135 foram pressionados por uma luta desmedida e imprópria para uma decisão de tamanha importância. É preciso, de alguma forma, encontrar a pacificação e o ponto de equilíbrio. Não podem contrários e favoráveis a qualquer tipo de controle do processo se comportar como estando numa guerra. Isso não promove o aperfeiçoamento e nem a confiança da população e torna-se muito ruim para todos nós. Raciocinemos que a urna eletrônica existe há 25 anos. Nesse intervalo a tecnologia desenvolveu-se muito e, pelo que se sabe, o sistema não evoluiu na mesma proporção. Tanto que, entre os que usam votação eletrônica, apenas três países aplicam as nossas urnas: Brasil, Butão e Bangladesh.
Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo) aspomilpm@terra.com.br
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