A Relação Entre Políticas Públicas e Tributos: Como o Modelo Tributário Contribuí Para o Aumento da Desigualdade social

 O Estado tem como objetivo garantir que se cumpram os princípios constitucionais. Um deles, segundo a constituição federal de 1988, (Art. 3 Inciso III – erradicar a pobreza a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais.) o desenho institucional brasileiro segue o modelo do Estado de bem-estar social. Que deve dar garantias para a que o cidadão leve uma boa vida em sociedade, garantindo-lhe: segurança no mercado de trabalho, garantia de renda, proteção contra riscos da vida social, pleno emprego e direitos sociais assegurados.

No entanto, para que tal situação ocorra é necessário que as políticas públicas cumpram o papel de promoção do bem-estar social, é a partir delas que conseguimos transformar a “vontade de constituição” em realidade concreta. Para que isso ocorra, o primeiro momento se dá no nível de tomada de decisão política, quem define a agenda do Governo são os representantes do cargo executivo, que tem legitimidade para tal, após passar pelo teste probatório, o processo de escolha democrática.

Dado o início do primeiro momento, que é do campo da política, a execução dessa formulação deve seguir o princípio da legalidade (Art. 5º inciso II da constituição federal). O Estado, para promover políticas públicas segue as normas estabelecidas para tal. As políticas públicas são traduzidas em programas, e ficam sob responsabilidade do corpo tecnopolítico que, tem a função de compatibilizar a idealização do projeto com as possibilidades efetivas que existem para aplicação concreta, seguindo os princípios legais.

Os programas são planos estruturados para resolver problemas e atingir objetivos, para realização de tal objetivo se utiliza de projeto atividades e ações. Sendo assim, os programas ao serem elaborados devem ter uma previsão de quanto custará e, por consequência, fica sujeito de acordo com a norma (Art. 165 §1° da constituição federal) a seguir as diretrizes de metas e despesas com os programas.

Tais diretrizes devem se encontrar no PPA (plano plurianual) que é definido como planejamento de médio prazo, com duração de quatro anos e deve ser elaborado pelo  poder executivo e encaminhado para a aprovação pelo o congresso; a LDO (lei de diretrizes orçamentarias) segue os mesmo princípios do PPA, porém suas metas são determinadas a curto prazo, no tempo de um ano; já a  LOA ( lei orçamentária anual) é elabora pelo congresso nacional com base na LDO, e podem ser adicionadas emendas, seu objetivo é fixar a despesa e estimar as receitas.

Desta forma, segundo a constituição federal (Art. 167 I – são vedados o início de programas e ou projetos que não estejam incluídos na lei orçamentária anual), todas a ações devem passar por estas etapas antes de sua execução. Contudo, é necessário que os processos decisórios, no momento de “disputa” do orçamento para a realização de programas, não sejam restritos apenas para quem tem mais facilidade de influenciar ou determinar as prioridades. O ideal é que haja uma maior participação popular, para isso, a política de orçamento participativo (OP) se mostra como uma ótima ferramenta, pois permite que cidadãos possam pleitear suas demandas de forma mais espontânea, estabelecendo uma conexão entre os interesses da população com o Estado, de acordo com as diretrizes da LC 131/09.

No entanto, para que o Estado consiga promover as mudanças na sociedade através das políticas públicas é necessário que se tenha recursos financeiros, esses são obtidos através dos tributos, mas, todos em determinado momento já ouviram a frase “nós pagamos muitos impostos”, isso realmente é verdade? vejamos:

Segundo o relatório da receita federal, publicado em novembro de 2018, a carga tributária brasileira em 2017 correspondeu a 32,43% do PIB, equivalente a 2,127 trilhões de Reais. Se comparado com outros países, o Brasil possui uma carga tributária inferior à da média da OCDE, que é de 34,3%. Porém, o que chama atenção em nosso modelo é a incidência na cobrança dos tributos, a renda é muito menos tributada que a média dos países da OCDE, ao passo que, se tributa mais o consumo. Desta forma, o modelo tributário brasileiro contribui para o aumento da desigualdade no país, uma vez que, as pessoas que possuem menor renda tendem a gastar a maior parte do seu salário em consumo. Enquanto quem tem maior renda, gasta uma quantidade proporcionalmente menor do seu dinheiro com o consumo.

Além do mais, a tributação de salário por meio de imposto de renda de pessoa física (IRPF), é dividida em apenas quatro alíquotas diferentes (7,5%, 15%, 22.5% e 27.5%) com a maior alíquota tributando o valor máximo de R$ 4.664,00. Ou seja, nosso sistema de tributação é regressivo e incide em maior parte sobre as menores faixas de renda.

Outro fator importante no trato da questão fiscal é a sonegação, é estimada pela Unafisco (União Nacional dos Auditores Fiscais) em R$ 500 bilhões a cada ano. Se faz necessário que exista uma lei mais severa, pois no atual momento, o pagamento do tributo antes de se aceitar a denuncia elimina a possibilidade de punição. Em caso de condenação, o pagamento, seja ele em um único ato ou parcelado, também livra a possibilidade de punição. Desta forma, se torna um excelente negócio sonegar tributos em nosso país.

Para além da necessidade de se existir uma lei que seja mais dura, é importante que haja por parte do poder público uma fiscalização mais eficiente, como apontado no relatório feito pelo TCU em 2017 mostrou que, a equipe operacional da receita federal não é suficientemente dimensionada para execução das tarefas.

 Outro risco identificado como sendo o mais elevado pelo relatório foi, a falta de funcionários qualificadas para realizar o dimensionamento da força de trabalho necessária, ou seja, existe uma ineficiência na gestão do órgão. Tal ineficiência impacta diretamente em sua operação, e por outro lado, quem tem a autoridade de cobrar boa conduta deveria ser exemplo.

A demanda por educação, saúde, segurança pública, e outros serviços promovidos pelo Estado em ultima análise se passa pela dimensão da tributação que as financia. Entender essa ligação entre as ações que o governo deve executar, e leis ao qual todos os indivíduos estão sujeitos, é essencial para formação da cidadania. O processo de formação de cidadania acontece por meio da educação, segundo a constituição (Art. 205 CF/88) a educação tem três objetivos: pleno desenvolvimento do indivíduo, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício da cidadania. Esses elementos também servem para dar coesão como nação, tais princípios devem ser objetivo comum e elo de ligação entre todos indivíduos presentes na sociedade.

Portanto, nos perguntar se pagamos ou não muitos tributos, não é a melhor pergunta a ser feita. A questão se passa por entender o motivo da cobrança de tributos e como cada cidadão está inserido dentro deste modelo. Ao entender esse processo a sociedade terá elementos para exigir maior eficiência e transparência na gestão dos recursos públicos, ao mesmo tempo se conscientizar sobre os deveres que cada sujeito tem como cidadão.

Texto produzido a partir da disciplina de direito financeiro, ministrada pelo prof. Dr. Marcelo Arno Nerling, no curso de Gestão de políticas públicas da Universidade de São Paulo (EACH-USP).

Ikaro Gomes dos Reis

Graduando de Gestão de Políticas Públicas

Escola de Artes, Ciências e Humanidades,

Universidade de São Paulo – EACH/USP

 ikaro@usp.br

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