Ao STF só o que é supremo

Assim que recrudesceu a crise político-administrativa, o Supremo Tribunal Federal, a nossa suprema corte de justiça, ganhou protagonismo e não saiu mais da mídia. Diz o artigo 102 da Constituição que “compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição” e decidir sobre ações que questionem a constitucionalidade de leis e atos normativos, e processar os chefes dos poderes e demais detentores de foro privilegiado. Se fizesse apenas isso, a corte não teria ganho a incômoda visibilidade, nem seus membros estariam sob o fogo cruzado dos que questionam seus atos e até duvidam de sua independência e honorabilidade.

Uma leitura rápida da Constituição, naquilo que se refere à Justiça, leva ao raciocínio de que os constituintes, que se preocupavam em parecer ultrademocráticos e avessos aos militares do período 64-85, entregaram todo o poder ao Judiciário, permitindo a este se imiscuir nos outros, mas impedindo a reciprocidade. O orçamento e a organização do Judiciário, por exemplo, são feitos pelo próprio, sem interferência de Executivo e Legislativo, mas o Judiciário pode questionar as ações do governo e das casas legislativas. Ignoraram os constituintes a advertência de Ruy Barbosa que, no começo do século, já dizia que a pior ditadura é a vinda do Judiciário, pois contra ela não temos a quem recorrer. A Carta que, além de princípios, tem a pretensão de normatizar a vida nacional, submete Executivo e Legislativo ao poder togado e, contra isso, não há o que fazer. Só mesmo uma reforma constitucional.

Os próprios políticos das últimas três décadas são os diretos responsáveis da ingerência judicial nas esferas de atribuição dos outros dois poderes. Quando perdem no voto das casas legislativas, batem à porta do Judiciário para conseguir seus intentos através do chamado “tapetão”. E Judiciário os atende.

Melhor seria que, como ocorre nos países mais estáveis e desenvolvidos, os onze ministros do STF só fossem provocados para dirimir dúvidas sobre a Constituição – sua função básica – ou desempatar questões legais ainda pendentes das cortes intermediarias e superiores (tribunais estaduais, regionais e STJ, TSE e STM) em definições de caráter coletivo.

Jamais atuassem sobre o caso concreto onde há um ou mais réus, como são os ruidosos processos onde condenados acabam libertos. A supremacia da corte tem sido usada, a nosso ver, indevidamente. Essas questões devem chegar ao fim, no máximo, no STJ. Preocupa-nos ver o STF perdendo seu tempo e autoridade com tabela do seguro de veículos, censura a produções humorísticas e coisas do gênero.

A suprema corte dos nossos sonhos é aquela de desconhece o nome escrito na capa dos processos, a ideologia dos pacientes e o clamor das ruas ou de grupo de pressão. Ela apenas modula e guarda a Constituição e desfaz dúvida ainda presente depois das questões terem tramitado pelas instâncias. No dia que assim a tivermos, o país desfrutará de maior segurança jurídica, os poderes da República, inclusive o próprio Judiciário, produzirão mais e com qualidade e, conjuntamente, seremos uma Nação melhor…

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo) aspomilpm@terra.com.br

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