Enchentes, negligência e eleições

As chuvas que têm castigado Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro e outros estados, são o testemunho da imensa dívida social e técnica dos poderes públicos e de seus operadores para com a população. Antes de ser alterado pelo homem, o ambiente era equilibrado e, mesmo quando ocorriam as cheias, ninguém saia prejudicado; pelo contrário, os elementos naturais – água, terra, ar e até o fogo – se complementavam e promoviam o ciclo vital. 

O homem chegou, se instalou nas margens dos rios, bebeu e usou a água limpa, devolveu-a suja e, além disso, desmatou as margens, provocando a derrubada da areia para dentro da calha e as enchentes. Ocupou áreas que a natureza utilizou durante séculos como caminho das águas e ainda se dá ao luxo de reclamar que do sofre os efeitos da enchente.
Essa é a problemática básica das água e seu controle ocorreu em todo o mundo. Os países desenvolvidos e ricos já a mitigaram através do emprego da tecnologia e altos investimentos. Não voltaram os rios ao status quo – o que seria impossível – mas construíram barragens de estabilização, canais de drenagem e outros sistemas de administração dos picos hídricos. Também resolveram a poluição através da coleta e tratamento dos esgotos. Assim se estabelece a convivência equilibrada entre a água, os homens e as comunidades.

No Brasil, país tropical, convivemos com o excesso de água especialmente no verão. Empregando técnicas mundialmente conhecidas, represamos os rios não só para controlar as cheia mas também gerar eletricidade, abastecer de água potável a população, irrigar a agricultura, dar de beber aos animais, lazer e transporte. Para o sistema funcionar, no entanto, é preciso uma série de cuidados que, por diferentes razões, são negligrnciados.

O poder público sempre fez vistas grossas ao surgimento de favelas e outra ocupações irregulares, muitas delas dentro da área de aluvião tradicionalmente ocupada pelos rios nos períodos de cheia. Além dos acidentes durante as chuvas, isso tem a consequência poluidora porque essa população faz seus despejos sem qualquer controle ou tratamento nos córregos afluente dos rios que servem a água para diferentes usos. Só no estado de São Paulo, com seus 645 municípios, existem 3 mil comunidades irregulares sem abastecimento de água potável por rede e nem coleta e tratamento de esgotos.

Outro problema grave é a falta de planejamento e correta execução dos conjuntos de obras. Os governos canalizam rios e riachos e constroem avenidas ditas marginais nos fundos de vale. É comum que a canalização, para onde o curso d’água é desviado, seja subdimensionada como medida de economia. Também há casos em que o projeto foi bem executado mas tornou-se insuficiente porque novas urbanizações foram executadas dentro da bacia de drenagem sem a implantação da rede de drenagem adequada. É por isso que, a cada ano, surgem mais pontos de alagamento nas cidades brasileiras. O país dispõe do histórico de chuvas de décadas e de conhecimento técnico para absorver os excessos de água. Mas os governantes buscam o mais fácil, empregando os recursos disponíveis em coisas que aparecem aos olhos do povo. Obra enterrada, mesmo que prioritária, infelizmente, não rende votos…

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo) 

aspomilpm@terra.com.br    

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