Voto impresso, irrelevante causa de crise institucional

O debate político enveredou para um terreno perigoso. Afora os homens e mulheres defendendo suas posições – o que é legítimo – contaminam-se as instituições. Seus titulares colocam o poder, que lhes foi outorgado para trabalharem pela Nação, a serviço da vaidade, da ideologia e do interesse próprio ou de grupos. No lugar da desejada paz indutora do trabalho, da prosperidade e do bem-estar, pontificam o voluntarismo, a represália, a invasão de atribuições, a capitulação e o desrespeito entre os contendores.

O estabelecimento do voto impresso pontifica como a gota que fez transbordar o copo já precário do respeito e da harmonia entre os três poderes. Não precisava o presidente da República bater forte a ponto de entenderem que se o voto impresso não for adotado temos o risco de não haver eleição; ele deveria ter explicado claramente o que significa isso, para não agitar a sociedade e principalmente a economia. Não devia o presidente do TSE ter ido ao Congresso em busca de os partidos substituírem seus membros da comissão que estuda a PEC 135 por outros comprometidos a votar contra. Os dois poderiam ter sido discretos e evitado o bate-boca que, queiram ou não, tumultua a vida e turva a imagem de suas instituições.

Não deveriam os ministros do Supremo Tribunal Federal inovar a ponto de, sem o concurso do Ministério Público, instaurar inquéritos, investigar, julgar e  executar a sentença.  Nem invadir as atribuições do Executivo privando-o de nomear seus auxiliares (como o ocorrido com o diretor da Policia Federal, entre outras) e compelir o Legislativo a fazer coisas, como o Senado a instalar a  malfadada CPI da Covid; e a tentativa de obrigar ao presidente da Câmara a tramitação de pedidos de impeachment. O pior é que o Senado cedeu na questão da CPI e a Câmara dos Deputados, mesmo não transigindo sobre os pedidos de impeachment, numa votação inédita, permitiu a prisão de um de seus parlamentares, que hoje se considera preso politico. O Poder Legislativo, por alguma razão, cedeu em suas prerrogativas. Há, ainda a questão da libertação e reabilitação eleitoral do ex-presidente Lula, que coloca a suprema corte em oposição aos ritos praticados pela Justiça brasileira, especialmente as instâncias que julgaram o processo do ex-governante.

Agora, há o movimento, na Câmara, para o plenário avocar o projeto do voto impresso e pautá-lo para votação na próxima semana. O argumento é de que a comissão especial, que o rejeitou, não tem poder terminativo e o soberano plenário, se quiser, pode contrariá-la. Se quiserem fazer bem feito, os deputados têm de considerar que a dúvida é técnica. Examinar as opiniões já colocadas sobre a segurança tanto do voto impresso quanto do não impresso e, se necessário, buscar laudos técnicos de outras fontes que orientem a sua decisão. Independente de sua opção, o parlamentar, como representante do povo, tem o dever de dar ao eleitorado a garantia de  que, nas próximas e futuras eleições, o voto depositado irá efetivamente para o candidato escolhido.  

Não existem fundadas razões para a proposta de impresso (ou não) dos votos precipitar uma crise institucional. A não impressão, a priori, não compromete a qualidade do pleito, assim como a impressão também não o levará à inviabilidade. O melhor seria que, em vez de duelar, as partes buscassem o consenso com o qual poderiam aperfeiçoar o processo eleitoral. A simples divergência é a prova de que há necessidade de correções e adoção de novas estratégias e tecnologias.

Apesar do nervosismo do momento, é preciso a ação de bombeiros para apagar esse incêndio. É contra os interesses nacionais e da cidadania termos Executivo e Legislativo frequentemente atropelados pelo Judiciário, e o Judiciário, inatento à sua tradicional neutralidade e condição de âncora constitucional, imiscuindo-se em questões políticas, legislativas ou administrativas. Com esse incômodo protagonismo de seus titulares, os poderes da República enfraquecem e escorre pelo ralo a esperança que todos nós temos de viver numa autêntica democracia. Ainda mais: a instabilidade prejudica a economia nacional, pois os investidores estrangeiros não vêm e os nacionais que puderem, internacionalizarão seus capitais…  

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo) 

aspomilpm@terra.com.br    

Seja o primeiro a comentar sobre "Voto impresso, irrelevante causa de crise institucional"

Deixe um comentário

Seu endereço de e-mail não será publicado.


*