A desajuizada América Latina

Não bastasse a crônica crise de Cuba, Nicarágua e Venezuela, presenciamos agora a deposição e prisão do presidente do Peru (que tentou fechar o Parlamento), num país onde recentemente um ex-presidente suicidou-se quando seria preso por corrupção e outro esteve no cárcere  por 15 anos, por desvios financeiros e crimes contra os direitos humanos. Na Bolívia, a ex-presidente está encarcerada desde março do ano passado, na Argentina a ex-presidente e atual vice-presidente Critisna Kirchner é condenada a seis anos de prisão e, aqui no Brasil, o ex-presidente Lula, libertado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e eleito para um novo mandato,  provoca manifestações nas portas dos quartéis. O continente passa por uma difícil quadra onde é difícil prever o desfecho. Espera-se pelo melhor, sem confrontos, com respeito ao povo e manutenção da democracia, por muito tempo fragilizada e ainda hoje ameaçada no continente.

Contestados os resultados das eleições presidenciais, milhares de brasileiros ocupam as portas dos quartéis e pressionam por apuração a  possíveis irregularidades que possam invalidar o pleito e contra a possibilidade de ser governados por alguém com problemas judiciais ainda não resolvidos. São intranquilizadores os informes chegados ao povo, por notícias ou, até fake-news. Tem-se como informação comum que os poderes institucionais estão atuando fora de seus devidos lugares. O Supremo Tribunal Federal estaria extrapolando em suas atribuições e o Poder Legislativo em omissão que cede espaço para o avanço do Judiciário sobre suas prerrogativas. O Executivo, a essa altura, nem é cobrado, porque tornou-se parte do problema na medida em que a eleição do seu titular é o objeto da contestação.

O povo, frente aos quartéis, pede socorro às Forças Armadas, que reconhecem o direito dos cidadãos se manifestarem – e até impedem que sejam reprimidos – mas estão silenciosas. O presidente Bolsonaro – comandante-em-chefe até o final do mês – também se mantém quieto, o que aumenta a expectativa de que algo imprevisto aconteça. O País precisa, urgentemente, de uma definição dos três poderes, especialmente do Judiciário e do Legislativo. O Judiciário, acusado de atuar fora de suas atribuições, deve justificar ao povo e, se possível, provar que as ações do ministro Alexandre de Moraes, por mais duras que sejam, estão dentro dos limites constitucionais. O Legislativo, por sua vez, tem a obrigação de provar e convencer que não tem sido omisso ao rejeitar medidas (pedidos de impeachment e CPI) contra os membros dos outros poderes (ministros do STF e presidente da República). Ambos devem adotar essas providências com toda a rapidez, antes que o povo – verdadeiro dono do poder, como define a Constituição – radicalize e o quadro se torne mais tenso e perigoso.

Os presidentes dos colegiados – ministra Rosa Weber, do STF, senador Rodrigo Pacheco e deputado Arthur Lyra – prestarão um grande serviço à Nação se conseguirem explicar ao povão, com uma certa dose de lógica e convencimento – que seus pares e eles próprios agem dentro dos ditames constitucionais. Ideal que também atuem esclarecendo ao povo quanto ao objetivo principal das manifestações: a prova de regularidade das urnas e das eleições em que foram utilizadas.

Todos precisam lembrar que o País – de 210 milhões de habitantes e uma das principais economias do mundo – não pode ficar à mercê de questões eleitoreiras e constitucionais mal resolvidas. Há todo um ordenamento jurídico a ser observado e respeitado para que a Nação volte à tranquilidade e possa produzir e cumprir seus compromissos que vão desde alimentar a própria população e exportar o excedente para matar a fome em outros pontos do planeta. A política e a estrutura institucional têm de ser facilitadoras, jamais inibidoras do processo produtivo e das atividades do Estado e da Sociedade. Diferente dos nossos vizinhos menores, o Brasil tem compromissos internacionais que não podem ser postergados. 

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves

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